Escrito por: Shvetank Shah – HBR / quarta-feira, 4 abril, 2012

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No mundo todo, a tomada de decisões na atividade empresarial entrou numa nova era. A capacidade de colher, armazenar, acessar e analisar dados cresceu em ritmo exponencial na última década. Hoje, empresas gastam milhões e milhões de dólares para administrar a informação que chega de fornecedores e clientes.

Mas, apesar da inebriante promessa sobre o retorno do investimento em montanhas de dados, empresas enfrentam um desafio. O investimento na análise de dados pode ser inútil, até contraproducente, se o pessoal não souber usar esses dados na hora de tomar decisões complexas.

Nosso estudo traz um alerta sucinto para gestores: neste exato instante, é bem provável que alguém em sua organização esteja tomando uma decisão equivocada com base em informações que custaram o olho da cara para conseguir.

Para ajudar organizações a medir e melhorar a desenvoltura do pessoal na tomada de decisões fundadas em dados, o Corporate Executive Board criou uma ferramenta, a Insight IQ, que avalia a capacidade de coleta e análise de informações relevantes. Avaliamos 5 mil funcionários em 22 empresas mundiais e dividimos todos em três grupos. “Empiristas categóricos” põem a análise antes do próprio critério e “tomadores de decisão viscerais” seguem exclusivamente o instinto.

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“Céticos embasados” — o pessoal mais bem equipado para tomar boas decisões — conseguem equilibrar critério e análise, possuem forte capacidade analítica e ouvem a opinião dos outros (ainda que dispostos a divergir). São o tipo de gente com domínio de dados que toda empresa deveria tentar cultivar. Descobrimos, contudo, que só 38% dos trabalhadores e 50% dos altos gerentes pertencem ao grupo. Nossa análise também revelou que setores cujo pessoal teve a maior pontuação média se saíam cerca de 24% melhor do que outros departamentos em uma longa série de quesitos, incluindo eficácia, produtividade, envolvimento do trabalhador e crescimento da participação de mercado.

Além de quantificar essa falta geral de habilidade, identificamos quatro problemas que impedem a organização de obter um retorno melhor sobre o investimento em dados:

Capacidade analítica está concentrada em pouquíssima gente. Quando um novo modelo de análise chega ao local de trabalho, é comum a empresa partir contratatando especialistas versados em seu uso, calculando que a habilidade acabará se disseminando entre todos. Mas muitas empresas não conseguem sair dessa fase do “especialista”. Têm um punhado de profissionais altamente tarimbados na análise de dados, mas ainda não começaram a ensinar todos os demais a usar a metodologia analítica.

TI precisa dedicar mais tempo à “I” e menos à “T”. A maioria dos departamentos de TI “cresceu” trabalhando com finanças, cadeia de suprimento e RH, onde as necessidades de negócio são claramente definidas, estáveis e relativamente uniformes ao longo de um vasto grupo de usuários. Outros departamentos podem ter outros requisitos de dados ou precisar usar os dados de um jeito difícil de articular claramente. Enfrentar esses desafios exige habilidades antropológicas e a compreensão de hábitos — atributos normalmente escassos em departamentos de TI.

Informação confiável existe, mas é difícil de encontrar. Muitas organizações carecem de uma estrutura coerente e acessível para os dados que colheram. São como bibliotecas sem um fichário e com livros sem capa. A chegada de mídias sociais, de novos canais de vendas e de aparelhos como tablets e smartphones dificultou ainda mais a gestão do conteúdo analítico. Menos de 44% dos trabalhadores dizem saber onde encontrar a informação de que precisam para o trabalho no dia a dia.

Executivos não administram informações tão bem quanto talentos, capital e marca. Muitos executivos tratam dados como algo de que o departamento de TI deveria se encarregr ou se consideram ignorantes demais para se envolver a fundo no modo como dados são compartilhados por toda a organização. Esses executivos precisam despertar para o fato de que o investimento em dados está dando retorno limitado porque a organização está investindo pouco demais para entender essa informação.

Como cultivar maiscéticos embasados

Empresas interessadas em fazer um uso melhor dos dados que coletam devem se concentrar em duas coisas: capacitar os trabalhadores para melhorarem seu domínio de dados, incorporar informações de forma mais eficiente na tomada de decisões e equipar esses trabalhadores com as ferramentas certas.

Parte do treinamento pode ser feita em workshops. Funcionários precisam reconhecer que nem todo número é igual — alguns são mais confiáveis do que outros. Precisam entender fatores e cálculos por trás das cifras e aprender a pensar de modo crítico sobre a exatidão, o tamanho de amostras, vieses e qualidade dos dados. Até gente que estudou estatística na faculdade provavelmente poderia usar uma reciclagem para poder aplicar melhor o que aprendeu lá atrás em sua atividade presente.

Mas workshops não são o único — ou necessariamente o melhor — caminho para transmitir essa informação. Um coaching contínuo é, não raro, mais eficaz. Para criar um ambiente no qual todo trabalhador receba a ajuda de que precisa, a empresa deve repensar o tipo de gente que contrata como especialista. Embora gerentes a cargo de contratações em geral atribuam um prêmio à habilidade quantitativa de analistas, uma capacidade superior de coaching vale mais. Em vez de simplesmente responder a perguntas que eventualmente surjam, especialistas em dados com traquejo com colegas podem dar treinamento informal e contínuo para funcionários em departamentos que não o seu, aumentando o Insight IQ geral da organização.

Muitas das melhores culturas movidas a dados formalizaram o processo de tomada de decisões, instituindo procedimentos comuns para que o pessoal possa obter e utilizar corretamente os dados mais adequados. Empresas devem tornar indicadores de desempenho transparentes e incorporá-los em metas do cargo. Também devem assegurar que sistemas de compensação premiem o diálogo e divergências. Grandes decisões muitas vezes exigem uma contribuição variada, críticas e questionamentos.

Contar com as ferramentas certas para criar e interpretar dados também é vital. Metade dos trabalhadores considera que a informação obtida de fontes empresariais está em um formato inutilizável. Para evitar o problema, as melhores empresas adotam um filtro melhor de informações e melhor visualização — por exemplo, podem criar gráficos em vez de dados em estado bruto.

Se tiverem de escolher entre dados bons o bastante já ou dados perfeitos mais tarde, a maioria dos executivos optará pelos primeiros, na crença de que podem aplicar seu juízo para preencher lacunas. Raramente se embrenham em informações, embora queiram saber que é possível fazê-lo.

Vejamos duas empresas que mostram uma crescente consciência dos benefícios do domínio de dados: Tiffany e Blue Cross and Blue Shield of North Carolina (BCBSNC).

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Ao adotar uma nova ferramenta de análise de dados, é comum a empresa conduzir workshops únicos excessivamente focados na ferramenta em si, em vez de mostrar como pode ser usada por gestores para melhorar seu juízo — e, já que o treinamento não se repete, há o risco de que seja rapidamente esquecido. A Tiffany faz ao longo do ano workshops que ensinam o pessoal a usar amplas categorias de informação (como vendas, merchandising no ponto de venda e dados financeiros) e instruem todos a criar indagações úteis e a empregar técnicas analíticas. Pesquisas indicam que apenas 25% de todos os trabalhadores do conhecimento recebem treinamento eficaz na análise e no uso de informações. Na Tiffany, quase todo trabalhador do conhecimento participa de uma orientação contínua sobre dados. Como resultado, fica mais equipado para explorar informações; já a equipe de TI passa mais tempo ajudando essa gente a extrair valor dos dados da empresa e menos tempo respondendo a simples questões de suporte de dados.

Para saber quantas ferramentas de “inteligência empresarial” a BCBSNC necessitava, a equipe de TI identificou dez habilidades que um trabalhador do conhecimento precisava para coletar, analisar e exibir informações para tomada de decisões. A equipe faz uma sondagem regular da força de trabalho para avaliar essas habilidades e cria treinamento e ferramentas novas, como dashboards e scorecards, para preencher qualquer lacuna que encontre. A empresa reconhece o trade-off entre ter ferramentas que otimizam a eficiência de cada trabalhador e assumir a despesa de criar e gerenciar uma montanha de ferramentas customizadas. Para dar apoio a um grupo diverso de trabalhadores a custo razoável, mantém de três a cinco “ferramentas empresariais” usadas pela maioria dos trabalhadores. Além disso, dá suporte a uma série de “ferramentas especiais” para equipes ou departamentos específicos. Com isso, está eliminando dezenas de ferramentas desnecessárias, garantindo que trabalhadores do conhecimento tenham as que precisam, tanto agora como à medida que o negócio, abordagens de análise e ferramentas mudem.

Recentes acontecimentos financeiros e empresariais mostram de forma inequívoca o que pode acontecer quando fartura de riscos e análise se chocam com lacunas de conhecimento ou lapsos de julgamento. Líderes precisam garantir que seus processos e recursos humanos acompanhem o poder de processamento de computadores e informações que importam. Para superar o déficit de insights, grandes volumes de dados — por mais completos ou bem analisados que sejam — precisam ser complementados por um grande critério.

Shvetank Shah é diretor do departamento de tecnologia da informação do Corporate Executive Board. Andrew Horne e Jaime Capellá são diretores-gerentes da entidade.

Fonte: Revista Harvard Business Review
Site: http://hbrbr.com.br/bons-dados-nao-garantem-boas-decisoes/